sábado, 9 de agosto de 2008

Ex-atéia conta sobre formação pró-aborto

Jennifer Fulwiler

“Não queria escutar muito sobre corações batendo, almas ou atividade
cerebral. Terminar uma gravidez simplesmente tinha que ser
aceitável...

”Austin / Cultura – Quando defendia o aborto, li que em certas
sociedades antigas era comum que os pais abandonassem os filhos não
desejados, deixando-os que morressem de frio. Estas histórias me
pareceram tão desconcertantes como horrorosas. Como podia acontecer
algo assim? Nunca entendi como culturas inteiras podiam apoiar algo
tão horrível. Como algo que a sociedade moderna olha como uma maldade
impensável podia gozar de tanta aceitação entre grupos tão grandes de
pessoas.

Devido a minha profunda pena ao inteirar-me destes crimes contra a
humanidade, achava muito irritante que os grupos pró-vida se
referissem ao aborto como "assassinato de bebês". Obviamente, ninguém
estava a favor de matar os bebês, e sugerir que aqueles que defendiam
a liberdade de escolher, defendiam também essa postura era um insulto
a todos os bebês que, no decorrer da história, foram assassinados por
suas sociedades "dementes". Nós não estávamos a favor de matar
ninguém. Simplesmente acreditávamos que a mulher tinha o direito de
terminar com o processo de gestação de um feto, diante de uma gravidez
crítica.

Era lamentável, mas esse era o sacrifício que tinha que fazer para
impedir que as mulheres se transformassem em vítimas de uma gravidez
não desejada.Naquela época eu era atéia e tinha pouco contato com
círculos sociais religiosos. No entanto, à medida que fui em busca de
Deus e abri minha mente ao cristianismo, comecei a ter contato com os
grupos pró-vida com maior freqüência, e fiquei na defensiva sobre meus
pontos de vista.


Uma noite estava discutindo o tema com meu marido, que estava
reexaminando sua própria postura a favor do aborto. Ao passar, fez um
comentário, que me fez reconsiderar o tema: "Acabo de pensar que ser
pró-vida é ser –a favor da vida de outras pessoas", disse em tom de
brincadeira. "Todos estão a-favor-de-suas-próprias-
vidas".

TRANSTORNO CRESCENTE
Com seu comentário percebi que meus pontos de vista favoráveis ao
aborto me colocaram na posição de decidir quais vidas eram dignas de
serem vividas e inclusive quem poderia ser considerado humano. Eu, com
os doutores, o governo e outros advogados do aborto, decidiríamos onde
traçar esta linha crucial. Quando acessava "web sites" católicos ou
livros que afirmavam que "a vida se inicia com a concepção", burlava-
me, como era meu costume; não obstante percebi que estava cada vez
mais incômoda com minha defesa. Dei-me conta de que meu critério para
determinar quando começa a vida era de uma ambigüidade angustiante.
Estava entregando o ônus da prova aos fetos, para que eles me
demonstrassem que eram humanos, e eu um juiz severo. Percebi que
olhava para outro lado quando ouvia falar sobre as ecografias em 3D
que mostravam os fetos tocando o rosto, sorrindo e abrindo os olhos em
etapas de desenvolvimento durante as quais ainda considerava o aborto
aceitável. À medida que a tecnologia moderna mostrou cada vez mais
evidências de que os fetos também são humanos, eu simplesmente
deslocava o limite do que eu considerava humano.

Em certo momento comecei a sentir que estava mais decidida a seguir
sendo pró-aborto que a analisar honestamente quem era humano e quem
não era. Também comecei a ver este fenômeno em outras pessoas dentro
da comunidade pró-aborto. Conforme comecei a pesquisar temas como o
aborto tardio, com freqüência, fiquei atônita a ponto de sentir-me
fisicamente mal, ao descobrir o nível de maldade que uma pessoa pode
suportar.

Não podia acreditar no que meus olhos liam, ao descobrir que
profissionais razoáveis e instruídos justificavam calmamente o
infanticídio, simplesmente chamando as vítimas de fetos em vez de
bebês. Esse foi o momento em que mentalmente dei um passo atrás a
respeito de todo o movimento pró-aborto. Se isto é o que significava
ser pró-aborto, eu não era pró-aborto.No entanto, eu ainda não podia
me catalogar como pró-vida.

Admiti que provavelmente eu também mentira a mim mesma para poder
manter meu apoio ao aborto. No entanto havia uma tremenda pressão que
me impediu ver o tema com objetividade. Algo dentro de mim gritava que
não era justo proibir o aborto para as mulheres, pelo menos durante o
primeiro trimestre, no sentido mais nefasto da palavra. Inclusive à
medida que me aproximei da religião, mentalmente, deixei de lado a
idéia de que provavelmente todos os seres humanos tenham uma alma
eterna que lhes foi dada por Deus, que é digna de respeito e
consideração. Descobrir quando recebemos essa alma foi muito
complicado, sendo a resposta mais óbvia "na concepção", em vez de
algum ponto arbitrário durante a gestação.

Só aceitei quando passei a valorizar os pontos de vista da sociedade
sobre o sexo que permearam a consciência de meu grupo é que fui capaz
de libertar a pressão interna que sentia e ver o aborto de maneira
decidida.

SEXO E CRIAÇÃO DE VIDA
Por haver crescido na classe média secular norte-americana, eu via o
sexo como algo desconectado da idéia de criar vida. Durante toda minha
infância não conheci ninguém que tivesse um irmãozinho ou irmãzinha; a
tal ponto que quando os pais do bairro falavam de gravidez era para
dizer que estavam contentes porque estavam "prontos". Nas aulas de
educação sexual na escola secundária, não aprendemos que o sexo dava
origem às crianças, senão que o sexo sem proteção gerava bebês.
Inclusive recentemente, antes que nosso casamento fosse abençoado pela
Igreja Católica, meu marido e eu fizemos um curso sobre como construir
um bom casamento. Era uma série (vídeo) de um grupo cristão não-
confessional, e na parte sobre "bom sexo" jamais se falou de crianças.
Em todo o tema de criar laços, fazer massagens, a intimidade e manter-
se em forma, o mais próximo que estiveram de relacionar o sexo com a
criação de vida foi uma breve nota que sugeria do que os casais
deveriam discutir o tema da anticoncepção.

Durante toda minha vida a mensagem que sempre ouvi forte e clara, era
que o sexo era para obter prazer e criar laços, que seu potencial para
criar vida era meramente tangencial, quase a ponto de esquecê-lo. Esta
perspectiva foi a base de minha visão sobre o aborto. Dado que, por
defeito, via o sexo como algo distante da possibilidade de criar vida,
pensava na gravidez não desejada como algo parecido a ser atingido por
um raio, quando se caminha pela rua –algo totalmente imprevisível e
imerecido que pode suceder às pessoas com vidas normais–. Meu ponto de
vista pró-aborto (e imagino que os de muitos outros) estavam motivados
por uma preocupação amorosa: simplesmente não queria que as mulheres
sofressem, que tivessem que desvalorizar-se, encarregando-se de
gravidez não desejadas.

Já que era uma parte inerente de minha cosmovisão que todos, exceto
aqueles que sofriam de ressaca, em algum momento faziam sexo, e que em
circunstâncias normais o sexo só se trata da relação entre duas
pessoas, senti-me atraída para uma das mentiras mais tentadoras da
história humana: : o inimigo não é humano. Os bebês transformaram-se
em inimigos por sua tendência a aparecer e arruinar tudo; e assim como
as sociedades se sentem tentadas a desumanizar seus semelhantes do
outro lado da linha, durante tempos de guerra, eu também, e nós como
sociedade, havíamos desumanizado o que víamos como inimigo do sexo.
Tudo mudou à medida que li os pontos de vista da Igreja Católica sobre
sexo, casamento e anticoncepção. Eu sempre havia assumido que os
ensinamentos católicos contra o controle da natalidade eram idéias
antiquadas, inclusive como uma tentativa pouco dissimulada para
oprimir os fiéis. No entanto, esses ensinamentos expressam uma maneira
fundamentalmente diferente de ver o sexo. E quando descobri isto,
nunca mais vi o mundo do mesmo modo.

CARGAS OU BÊNÇÃOS?
Da maneira como eu sempre o vira, a idéia geralmente aceita era que as
crianças são cargas, exceto por umas poucas vezes na vida quando tudo
pode andar tão perfeito entre o casal que eles vêem uma nova vida como
algo positivo. Descobri que a perspectiva católica é que os bebês são
bênçãos e embora a gravidez possa ser evitada por razões poderosas, se
formos tão longe como para adotar uma "mentalidade anticonceptiva" —
acreditando no direito do sexo com prazer, mas odiando suas
propriedades geradoras de vida- não só estamos faltando o respeito a
este ato que está entre os mais sagrados, senão que começamos a ver a
nova vida como o inimigo.

Dei-me conta que o uso generalizado e a aceitação dos anticonceptivos
em nossa cultura significavam que a "mentalidade anticonceptiva" para
o sexo era agora a atitude por defeito. Como sociedade, tínhamos
certeza de que tínhamos direito aos aspectos agradáveis e de relações
que implicam sexo inclusive quando nos opomos à nova vida que dessa
relação possa surgir. A opção de abster-nos do ato que gera crianças,
se elas forem vistas como uma carga, havia sido eliminada de nosso
léxico cultural. Inclusive se ficar grávida fosse uma crise de
proporções, de qualquer jeito teríamos direito a ter sexo.

Se isto fosse verdadeiro –se fosse moralmente aceitável para que as
pessoas façam sexo inclusive quando pensam que uma criança pode
arruinar suas vidas- então o aborto, tal como eu via as coisas,
deveria ser aceito.Na realidade, eu deveria ter tido um olhar objetivo
a respeito do início da vida e haver baseado meus pontos vista só
nisso, mas a mentira era tentadora demais. Não queria escutar muito
sobre corações batendo, almas ou atividade cerebral. Terminar uma
gravidez simplesmente tinha que ser aceitável, porque ter um filho,
transformar-se em pai é um tremendo assunto, e a sociedade deixara bem
claro que o sexo não era um assunto tão tremendo. Enquanto eu
aceitasse a premissa de que ter sexo com uma mentalidade
anticonceptiva era moralmente aceitável, não podia considerar que o
aborto pudesse não ser aceitável.

Parecia desumano obrigar as mulheres a enfrentar conseqüências que
alterariam suas vidas eternamente, por um ato que não contavam que
trouxesse conseqüências que alterariam suas vidas.Dada educação, a
idéia católica de que sempre devemos tratar o ato sexual com assombro
e respeito, tanto assim que deveríamos simplesmente abster-nos se nos
opomos a seu potencial criador de vida, era uma mensagem
revolucionária. Ser capaz de considerar honradamente quando começa a
vida, abrir meu coração e minha mente à maravilha e dignidade,
inclusive ao mais diminuto de meus semelhantes, não me afetou, até
compreender, em primeiro lugar, a natureza do ato que cria estas
pequenas vidas.

Todos estes pensamentos estavam sendo filtrados em meu cérebro,
durante um tempo, e percebi que estava cada vez mais de acordo com as
posições pró-vida. E certa noite converti-me oficialmente e
abertamente ao movimento pró-vida. Estava lendo outro relato das
sociedades gregas onde as crianças recém-nascidas eram abandonadas
para que morressem, perguntando-me como as pessoas normais podiam
fazer algo assim, e senti um calafrio pelo corpo: eu sei como faziam
isso.Nesse momento me dei conta que pessoas perfeitamente boas e bem
intencionadas –pessoas como eu mesma- podem apoiar tamanhas maldades
pelo poder das mentiras. Por minha própria experiência, soube como os
gregos, os romanos e pessoas de outras sociedades podiam ficar num
estado mental tal que podiam deixar um recém nascido abandonado para
que morresse.

As verdadeiras pressões da vida –"não podemos manter outra criança",
"não podemos ter outra menina", "não teria uma boa vida"– tornaram-nos
susceptíveis à tentação de desumanizar outros seres humanos. Apesar de
que as circunstâncias fossem diferentes, o mesmo processo acontecera
comigo com o movimento pró-aborto e com qualquer um que tenha tentado
desumanizar pessoas que lhes resultassem incômodas.Suspeito que
enquanto esses pais gregos entregavam seus recém-nascidos para que
alguém os levasse, comentavam o pouco que se pareciam estas pequenas
criaturas com seus outros filhos: não podiam falar, não podiam sentar,
e certamente esses pequenos bocejos e sorrisos eram só reações
involuntárias.

Aposto que se referiam a essas crianças com palavras diferentes das
que usavam para referir-se aos filhos que conservavam. Talvez eles
fossem chamados como "fetos".

Jennifer Fulwiler é uma desenhista de página web que vive em Austin,
Texas, com seu marido e seus três filhos. Foi atéia e em 2007 se
converteu ao catolicismo e escreve sobre sua conversão em:
http://www.conversiondiary.com/.Jennifer Fulwiler escreveu este artigo
para a revista America: www.americamagazine.org.www.miradaglobal.com
(Fonte: www.amaivos.com.br)